Negócios Processuais
Caso prático 67
António, residente no Porto, proprietário do imóvel X, situado em Aveiro, com a área de 1000m2, intenta a competente acção contra Bento, residente em Loulé, na qual pretende o reconhecimento do seu direito de propriedade sobre o referido imóvel, porquanto bento aclama em público imóvel sempre pertenceu a sua família.
c) António e Bento estão dispostos a chegar a acordo nos seguintes moldes: Bento reconhece a propriedade de António sobre uma parcela do imóvel X, nomeadamente sobre 750m2, e este último aceita a propriedade de bento sobre o restante. Analise a admissibilidade de um acordo feito nestes moldes.
d) Na questão anterior, imagine que o mandatário judicial do autor agiu ao abrigo de uma procuração forense que lhe concedia poderes gerais. Quando o Autor é notificado da sentença homologatória de tal acordo fica bastante indignado pois não pretendia desistir da instância.
c) Na alínea em júdice há composição da acção por negócio processual, este acto do processo consiste em negócios jurídicos que produzem directamente efeitos processuais, ou seja, são actos de carácter processual com natureza negocial, actos estes que extinguem, modificam ou extinguem uma situação processual.
Em consequência da sua natureza negocial estes actos jurídicos exigem uma vontade de acção, pensamento traduzido numa declaração negocial, e um efeito jurídico, traduzido no resultado pretendido.
Estes actos quanto a qualificação podem ser unilaterais ou bilaterais, o princípio do dispositivo é evidentemente materializado neste contexto em que a desistência do pedido ou da instância pode ser declarada unilateralmente (dependerá da aceitação do réu na situações em que este já tenha deduzido oposição, art.296nº1 e 2 do CPC).
Os negócios processuais bilaterais são também designados contratos processuais onde a natureza negocial é evidente.
Consoante o momento da sua conclusão este tipo de actos podem ser, interlocutórios ou preparatórios distinguindo-se os primeiros por serem celebrados antes da propositura da acção (exemplo a celebração de um pacto de jurisdição de competência art.99 e 100 do CPC) e os últimos por serem se realizaram durante a pendência da causa (como por exemplo a confissão do pedido, art.293, nº1).
Estes actos constituem causas de extinção da instância e do pedido art.287 al. d e 294 do CPC.
Analisando este caso conclui que se esta perante um negocio processual interlocutório pois já ocorreu depois da instancia iniciada, art.267nº1 do CPC, ou seja, já depois de recebida a petição inicial pela secretaria, e que se trata de uma transacção, isto é trata se de um contrato processual de natureza negocial pelo qual as partes previnem ou terminam um litigio mediante concessões recíprocas, definição esta que resulta do art.1248 nº1 do CC.
A transacção pode ser qualificada quanto ao momento como extrajudicial, situação esta em que as partes determinam o fim de um litigio futuro (negocio processual preparatório), ou judicial em que as partes terminam um litigio presente (negocio processual interlocutório), na transacção extrajudicial ainda não há qualquer acção pendente, na transacção judicial as partes põe termo a um processo pendente.
A transacção também pode ser qualificada quanto ao objecto, sendo quantitativa ou novatória, quando as concessões recíprocas das partes se traduzam apenas numa modificação do quantum do objecto da causa a transacção será quantitativa, que e o que sucede neste caso pratico, será novatória quando as concessões recíprocas entre as partes impliquem a constituição, modificação ou extinção de direitos diferentes do objecto do litigio.
Finalmente a transacção pode ser qualificada quanto à produção de efeitos jurídicos. Pois sendo um negócio jurídico processual produz efeitos materiais e processuais, os materiais serão os que se refiram à definição da situação substantiva entre as partes, os efeitos processuais traduzem-se numa modificação do pedido ou na extinção da instância consoante a amplitude da transacção em relação ao objecto do processo art.294 e 287 al. d do CPC.
Desta forma estamos perante um negocio processual bilateral que e traduzido numa transacção que se pode qualificar como o contrato processual pelo o qual as partes fazem concessões recíprocas tendo em vista o fim do litigio art.1248 do CC, que foi constituído na pendência da acção por isso será qualificado quanto ao momento como interlocutório e quanto ao objecto será uma transacção quantitativa, visto que, das concessões mutuas entre as partes não resultam novas situações jurídicas quer substantivas quer adjectivas.
Analisando subsequentemente os pressupostos dos negócios processuais a este caso pratico, sendo um acto processual atendendo a sua natureza é também um negócio jurídico, com tal e nessa qualidade que terão que ser observados os requisitos como uma dicotomia entre o direito substantivo e o adjectivo, desta forma o negocio processual exige os requisitos gerais para os actos processuais como a representação judiciaria, patrocínio judiciário, capacidade e interesse processual entre outros, no entanto os negócios processuais quando não são tipificados como negócios materiais, como sucede com a transacção, são tratados, no seu regime, como os correspondentes negócios substantivos, produtores de idênticos efeitos quanto aos sujeitos, quanto á vontade e sua exteriorização e quanto a seu objecto, neste caso tendo em analise o elemento escrito conclui se que não houve qualquer vicio, pois presume-se haver legitimidade das partes que estas estejam representadas em juízo, que os as partes possam dispor sobre o objecto processual, dai extrai-se admissibilidade do acordo entre A e B faltando apenas subsequentemente a homologação pois trata se de uma transacção judicial, e verificar se o negocio processual não viola o acto jurídico substantivo que lhe dá origem.
A transacção só é admissível desta forma se a disponibilidade sobre o objecto existir, art.299 nº1 do CPC, pois esta não é admitida se o seu objecto processual e substantivo for relativamente a situações jurídicas indisponíveis, art.299 nº1 do CPC e art.1249 do CC, (o juiz providenciará tentativa de conciliação se as partes poderem dispor sobre o objecto em causa art.652 nº2 do CPC), quanto aos limites substantivos há que verificar se a parte tem legitimidade para dispor sobre o objecto aferindo-se assim a legitimidade mas também se o negocio jurídico é ilícito, art.1249 e 280 do CC. Desta forma nesta hipótese o objecto processual e uma direito de propriedade e admissibilidade da hipótese aférese sobre a sua possibilidade assim conclui que o direito de propriedade não e um direito objectivamente indisponível como tal transigir sobre este objecto e causa é possível, pois não há nenhuma regra imperativa que seja contraria a transacção relativa a este bem.
Relativamente a forma esta transacção é judicial, sendo que só a extrajudicial é que tem que contar de escritura publica quando dela possa derivar algum efeito para o qual a escritura publica seja exigida, para o registo de bens imóveis neste caso, art. 1250 do CC, sendo esta uma transacção judicial pois esta pendente o processo, é aplicável o disposto na art.300 do CPC, a transacção faz-se sempre por termo no processo, ou por documento particular ou autêntico, mas sem prejuízo das exigências de forma do direito substantivo. Quando resultar de conciliação obtida pelo juiz art.300 nº 4 1ª parte e 509 nº3 ex vi art.508-A nº1 al. a, 652 nº2 do CPC, a transacção far-se-á em acta e será homologada por sentença, art.300 nº 4, do CPC, concluindo neste caso pratico sendo o objecto processual um direito relativo a um imóvel cabe a escritura publica art.1250 do CC e art.80 nº 1 do código do Notariado.
Em suma a admissibilidade de uma transacção judicial aférese se esta respeitar os requisitos processuais e não violar os limites substantivos.
Na transacção as custas processuais são reguladas pelo art.451 nº2 do CPC.
d)Desta forma sendo a transacção possível entre as partes por o objecto processual ser relativo a um direito de propriedade, analisa-se se esta pode ser realizada pelo mandatário judicial e como este pode transigir sobre o objecto e em que termos.
O mandatário judicial representa a parte em juízo em todos os actos e termos do processo, art.36 1ª parte do CPC, para que o mandatário proceda desta forma tem que estar habilitado por um mandato, acto este que confere os poderes ao causídico para actuar em sua representação, judiciaria.
No entanto para transigir sobre o objecto processual, o simples mandato que confere poderes de representação gerais não é suficiente para que este possa outorgar uma transacção art.37 nº2 do CPC, só há procuração especial quando a parte autorize expressamente o mandatário a praticar tal acto processual. Desta forma só o mandatário com poderes especiais pode transigir o pedido, ilação que também se retira do art.509 nº2 do CPC.
Então nesta situação houve insuficiência ou irregularidade do mandato judicial, como tal é possível ao mandante tomar providências quer em relação ao processo quer em relação ao mandatário. Em relação ao processo quando a nulidade do negócio processual resulte da insuficiência ou irregularidade do mandato, a sentença homologatória art.300 nº1 e 3 será lavrada como esta o acordo entre as partes, no entanto esta será notificada pessoalmente ao mandante, podendo este, nos 10 dias subsequentes, declarar se não ratifica o acto do mandatário, se o autor se abster da prática de qualquer acto o negócio processual e havido por ratificado e a nulidade considera se sanada, (interessante esta solução de nulidade sanável, o que faz dela uma invalidade mista) neste caso e operante a”revelia” do autor, pois haverá consequências, no entanto se o mandante declarar que não ratifica o acto do mandatário, este quanto a si não produzira qualquer efeito processual art.301nº3 do CPC. A falta de poderes do mandatário judicial e a irregularidade do mandato não justificam assim a recusa da homologação, afirmação esta que resulta da natureza substantiva da composição do negocio processual, o juiz apenas verifica a pertinência do objecto do negocio processual pelo qual as partes fazem valer o negocio de auto-composicão do litigio mas neste caso em que há uma transacção judicial o Juiz deve ter em conta que esta pode produzir uma constituição, modificação ou extinção de direitos diversos do controvertido art.1248 n2 do CC. O Juiz também não tem o dever de indagar sobre os pressupostos processuais o que quanto a transacção é consequência da sua natureza substantiva, o que o juiz verifica e relativamente ao objecto do processo do negocio processual se este estava na disponibilidade das partes art.299 do CPC se há idoneidade negocial art.280 e 281 do CC e relativamente ao qualidade dos sujeitos se a sua capacidade e legitimidade para disporem sobre o objecto do processo, desta forma o juiz não deve indagar sobre os pressupostos processuais, concluindo a providencia do mandante contra o excesso do mandatário e a não ratificação da sentença homologatória consequência essa que implica o não cessar do litigio e a continuação do litigio. Tendo em conta o prazo de apenas 10 dias se o autor nada fizer considera se sanada a irregularidade, no entanto o autor tem sempre a disponibilidade de proceder a uma acção de declaração de nulidade da transacção efectuada pelo mandatário, art.300 nº1 do CPC, acção esta que tem que ser autónoma, mas esta acção dirigida quanto a um acto das partes, terá que ser arguida se for procedente, pela interposição de um recurso de revisão, art.771 al. d do CPC, em que o autor devera provar os factos que consubstanciam essa invalidade art.775 nº2 do CPC, essa invalidade resulta neste caso de o mandatário ter feita a transacção ter sido feita por intermédia de mandatário judicial sem poderes especiais art.37 nº2 do CPC, refira se ainda que no caso de o recurso ser procedente pelo art.776 n1 al. c o CPC, o processo será reapreciado novamente com nova instrução e novo julgamento aproveitando se a parte do processo que o fundamento do processo não haja prejudicado. Temos então enormes consequências processuais, efeitos que ponderam ser frequentes uma vez que o juiz não tem o dever de indagar pressupostos processuais. A sentença homologatória só produz caso julgado formal, art.672 do CPC
Os efeitos que o mandante pode repercutir no mandatário judicial que agiu sem a procuração que lhe concedia poderes especiais, poderes esses sem os quais não poderia transigir sobre o objecto, serão o da responsabilidade civil e o da responsabilidade disciplinar.
O mandatário judicial responde perante o mandate sob a égide da responsabilidade civil pelo art.40nº2 do CPC e art.383 do CC, tendo em conta a opinião do Prof. Lebre de Freitas pois o mandatário age com culpa pois não deve desconhecer o facto de agira sem procuração especial, para o Prof. Abílio Neto não é de aplicar a 3ª parte do art.40 nº2 do CPC quando falte só a procuração pois esta permite sanação art.40 nº2 2ª parte do CPC, e portanto não haverá consequentes efeitos jurídicos para o autor se este optar pela não ratificação do acto do mandatário judicial, na opinião do Prof. Lebre de Freitas esta situação preenche um excesso de mandato em que há uma actuação por parte do mandatário com consciência de facto como tal como tal o mandatário fica condenado na indemnização dos prejuízos que o seu acto tenho causado ao autor art.40 nº2 3ª parte do CPC.
Este acto do mandatário judicial terá ainda consequências disciplinares pelo art.40 nº3 do CPC, com a participação da ocorrência ao conselho distrital da Ordem dos Advogados.
Na resolução deste caso pratico parti do suposto que o mandatário judicial e que teria realizado a transacção em representação do autor, e não como ele tendo desistido da instância, pois a transacção judicial tem como consequência processual a extinção da instancia art.294 e 287 al. d do CPC. Como tal resolvi esta hipótese tendo em conta a anulação de um negócio processual e não propriamente a desistência do pedido, que no entanto os procedimentos são os mesmos.
Bibliografia:
PIRES DE LIMA, ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado 2ª edição.
LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA, RUI PINTO, Código do Processo Civil Anotado, 2ª edição.
ABILIO NETO, Código de Processo Civil Anotado.
TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o novo Processo Civil, 2ª edição, LEX, 1997.
REGIMES DE BENS DO CASAMENTO - reflexões II
Há 15 anos


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