terça-feira, 5 de maio de 2009

FASES DO PROCESSO CIVIL - A CONDENSAÇÃO E SANEAMENTO

14, 50 valores

Fase da Condensação








Despacho Saneador













Índice;

 Fase da Condensação;
 Despacho Pré – Saneador;
 Audiência Preliminar;
 Despacho Saneador (ex.);
 Matéria Instrutória;











Fase da Condensação;

Numa primeira função, cabe a verificação da regularidade do processo e, sempre que possível, a sanação das excepções dilatórias e das nulidades processuais: é a função de saneamento. Inclui-se ainda o convite à correcção e ao aperfeiçoamento dos articulados e a determinação das questões de facto a resolver: função de concretização.
A função de saneamento visa resolver os impedimentos à apreciação do mérito da acção e sanar as nulidades processuais e a função de concretização permite delimitar as questões de facto relevantes para a decisão da causa. Todas estas funções prosseguem uma finalidade de condensação.
Esta função comporta três actos: o despacho pré-saneador (artº508), a audiência preliminar (arts. 508º-A e 508º-B) e o despacho saneador (art.º510).
Terminada a fase dos articulados, a lei designa, a partir da reforma processual de 1995/1996, a fase seguinte por audiência preliminar. Esta expressão não retrata de forma suficiente esta fase processual, pois atinge apenas o seu aspecto estrutural, a qual nem sempre se verifica, podendo, como veremos, o juiz dispensar a realização da audiência preliminar (art. 508.º-B/1, CPC). Esta fase processual visa, acima de tudo, terminar o processo (por absolvição da instância ou do pedido ou conciliação das partes) ou, devendo este continuar, fixar os termos essenciais do objecto da causa, delimitando as questões de facto relevantes (que já possam ser dadas como assentes e as questões controvertidas, sobre as quais há versões divergentes por parte dos litigantes). Mas antes de equacionar logo aqui o termo do processo, o juiz deverá analisar a regularidade do processo e, sempre que possível, promover a sanação das excepções dilatórias, as irregularidades dos articulados e das nulidades processuais. Findos os articulados, o juiz irá assim tomar contacto, pela primeira vez (caso não tenha já tomado contacto com a petição inicial, no despacho liminar), com o processo – e com as alegações das partes. Por isso, não só tem eventualmente que suprir excepções dilatórias, convidar as partes ao aperfeiçoamento dos articulados (ou da matéria alegada), como, devendo o processo prosseguir para a fase da instrução, fixar, com a audiência das partes, os termos do litígio, ou seja, seleccionar a matéria de facto relevante que se considera assente (a antiga especificação) e a que irá constituir a base instrutória da causa (o antigo questionário), por ser controvertida.
Nem todos estes ciclos processuais são obrigatórios. Verdadeiramente, só é obrigatório o despacho pré – saneador – quando o juiz detecta a falta de pressupostos processuais sanáveis e irregularidades nos articulados, quer porque carecem dos requisitos legais (forma não articulada das proposições linguísticas, falta de autonomização das excepções ou do pedido reconvencional, redacção em língua estrangeira, etc.), quer porque não foram acompanhados de documentos essenciais – e o despacho saneador. Mas mesmo este último despacho pode não ser realizado, porque as partes hajam transigido (art. 1248.º CC) ou conciliado (art. 508.º-A/1/a), CPC), terminando o litígio através de recíprocas concessões.













Despacho Pré – Saneador;

O despacho pré – saneador é proferido pelo juiz sempre que importe obter a sanação das excepções dilatórias (art. 508.º/1/a), CPC), ou convidar as partes ao aperfeiçoamento ou à correcção dos articulados das partes (art. 508.º/1/b), CPC). O tribunal pode ordenar nesse despacho, de acordo com os exemplos proferidos pelo Professor Teixeira de Sousa:
a) Citação da administração principal (art. 8.º CPC);
b) Representante do réu incapaz (art. 24.º/2, CPC); pode ainda solicitar-se ao mandatário judicial a entrega da procuração forense;
c) Sempre que a sanação dependa de um acto das partes, o tribunal deve convidar a parte a praticá-lo (art. 265.º/2 CPC): é o que sucede, por exemplo, com a sanação da ilegitimidade plural através da intervenção provocada de um terceiro (arts. 269.º/1, e 325.º/1, CPC).

O Professor Teixeira de Sousa, de acordo, com o artigo 508.º/6, CPC, defende que, o despacho pré – saneador não é recorrível; segundo o autor, esta irrecorribilidade justifica-se porque, nessa eventualidade, não há uma decisão, mas antes uma abstenção de decisão (ROA 54 (1994)); o facto de as partes serem convidados a aperfeiçoar ou a corrigir o seu articulado, isso não implica a preclusão do conhecimento de qualquer excepção dilatória no despacho saneador (art. 510.º/2 CPC).
O despacho em causa, analisa os vícios da fase dos articulados, referente à irregularidade e à deficiência; pode justificar-se o conhecimento imediato do mérito da causa, o que o tribunal só pode fazer no despacho pré – saneador se a audiência preliminar for dispensável, isto é, se a decisão sobre o mérito se revestir de manifesta simplicidade (art. 508.º-B /1/ b) CPC); se a parte não sanar, não à segunda oportunidade, esse convite (art. 508.º-A/1/c) CPC), só pode ser realizado nesse momento, quando o não tenha sido anteriormente no despacho pré – saneador; ficam precludidos os factos que poderiam ter sido alegados pela parte em resposta ao convite do Tribunal.
Este despacho, visa, analisar os aspectos jurídicos – processuais da acção e verificar a eventual (in) existência de irregularidades da instância, se os articulados respeitam os requisitos processuais, se ocorre a falta de pressupostos processuais ou se os factos articulados padecem de insuficiências ou de imprecisões na exposição e caracterização da matéria de facto.
Incumbe ao tribunal providenciar oficiosamente pelo suprimento de pressupostos processuais sanáveis (art. 508.º 1/a), CPC), ou de outras irregularidades da instância, bem como a prática de actos que devam ser realizados pelas partes, convidando-as a praticá-los (efectuado logo pelo juiz, arts. 7.º, 23.º, 24.º, 269.º/1, 325.º, CPC).
Haverá despacho pré – saneador quando o juiz detecte dois tipos de irregularidades nos articulados:
a) Quando o articulado não observe os requisitos legais (não esteja assinado na língua portuguesa); não indique o valor da reconvenção, etc;
b) Quando o articulado não seja acompanhado de documento essencial, ou de que a lei faça depender, art. 508.º/2 CPC, (certidão que prove o registo da acção relativa a direitos reais, art. 3.º CRP);
O despacho pré – saneador é emitido, quando o réu não tenha contestado e a revelia seja operante, nos termos do artigo 484.º/1 e 2, CPC (o juiz apreciará a regularidade da instância).
No que se refere à análise dos aspectos jurídicos – processuais, pode implicar, a rejeição dos articulados (art. 474.º CPC); a absolvição da instância, se a irregularidade respeitar à petição inicial (art. 287.º a), CPC); suspensão da instância (se faltar a prova de um registo, art. 276.º/1, d), CPC), salvo se o registo for dever do réu reconvinte (art. 501.º/3, CPC), e ainda, a impossibilidade de o facto poder ser dado como provado e o julgamento do mérito da causa (absolvição do réu do pedido ou condenação do réu no pedido) ser feito em atenção a essa falta.
Caso o juiz omita este despacho, quando não o podia fazer (acto vinculado), estamos perante uma nulidade processual (art. 201.º CPC), arguida no prazo de 10 dias (art. 153.º/1, CPC). Quando o juiz o profira, os Professores Remédio Marques e Lebre de Freitas, dizem que este despacho é irrecorrível, já que reveste uma natureza provisória: a parte pode, ou não, corresponder ao convite para corrigir.
O tribunal pode utilizar o despacho pré – saneador para provar à correcção de aspectos respeitantes ao objecto do litígio, com vista a convidar as partes a corrigirem ou aperfeiçoarem os respectivos articulados (arts. 508.º/1 b), 3.º, CPC). Quando a deficiência respeita ao conteúdo do articulado e à apresentação da matéria de facto: o articulado contém deficiências ou imprecisões na exposição ou concretização da matéria de facto (art. 508.º/3, CPC9. Segundo o Professor Remédio Marques o novo articulado, caso a parte convidada a sanar o faça, não pode ter nova fisionomia factual (art. 508.º/5 CPC), visto que, não pode modificar o objecto definido pelo autor na petição; nem para alargar a defesa constante da contestação.
A correcção das deficiências pode levar a:
a) Improcedência da acção;
b) Prosseguimento dela para audiência de discussão e julgamento;
c) Procedência da acção no despacho saneador ou na sentença final;
d) Absolvição da instância;
Na audiência preliminar (caso se realize), não se pode suscitar um novo convite do juiz, não deve uma segunda oportunidade, na opinião do Professor Remédio Marques.









Audiência Preliminar;
Entre 1939 e 1995/1996, a audiência preliminar, designava-se por audiência preparatória. Para o Professor Remédio Marques, estamos perante um ciclo processual eventual, mesmo nas acções declarativas comuns na forma ordinária (art. 508.º-B CPC). Não sendo de convocação obrigatória, a sua realização constitui, ainda, a regra nas acções comuns que seguem a forma de processo ordinário. A audiência preliminar é quase sempre facultativa – acções comuns na forma sumária (art. 787.º/1 CPC) – só quando o princípio do contraditório ou a complexidade da causa o imponham, se tornará essencial a sua realização; no entanto existem duas situações em que ela é obrigatória:
a) Quando o juiz deva apreciar excepções dilatórias não discutidas pelas partes, ou possa imediatamente conhecer do mérito da causa cuja perspectiva jurídica não chegou a ser considerada pelas partes explicita ou implicitamente (art. 508.º-A, b), CPC);
b) Tendo a acção sido contestada, a selecção da base instrutória seja complexa; nestes casos a omissão da convocação da audiência preliminar, pode gerar nulidade processual, contanto que possa influir no exame ou na decisão da causa (art. 201.º CPC), o que somente no final da acção poderá ser apurado, porém, o Professor Remédio Marques têm dúvidas, caso haja deficiências na exposição da matéria de facto (art. 508.º-A/1 c), CPC); contudo, ela só é obrigatória quando haja deficiências manifestas nos articulados.
Marcada pelo tribunal para os 30 dias subsequentes ao termo da fase dos articulados, ao suprimento das excepções dilatórias ou à correcção ou aperfeiçoamento dos articulados; não exclui a possibilidade de o tribunal conhecer do mérito da causa no despacho saneador (arts. 508.º3 e 510.º/1 b), CPC). Se a audiência preliminar não se realizar, a selecção da matéria de facto é efectuada pelo juiz no despacho saneador (art. 508.º-B/2, CPC).
Esta audiência pode, de facto ser dispensada quando a simplicidade da selecção dos factos (a dar como assentes, por outro, e a considerar controvertidos, por outro) não justifique a sua convocação (art. 508.º-B/1 a), CPC); e quando a sua realização tenha por finalidade facultar a discussão de excepções dilatórias e estas já tenham sido debatidas, nos casos em que a sua apreciação revele manifesta simplicidade, nos termos do art. 508.º-B/1 b), CPC (ou se trate excepções não contestadas nos articulados, de conhecimento provocado ou excepções de conhecimento oficioso arguidas por qualquer uma das partes).
Nesta audiência preliminar, se a houver, realizam-se vários actos. Um deles deverá consistir na prolação do despacho saneador – despacho de prolação obrigatória, que é nesta audiência preliminar ditado para a acta da audiência -, o qual visa a apreciação da regularidade do processo (após terem sido corrigidas as irregularidades) e o controlo da admissibilidade do conhecimento do mérito da causa (absolvendo do pedido ou condenando logo o réu no pedido), se os elementos fornecidos, nesse momento, pelos autos, já justificarem essa antecipação e o encurtamento do processo. Mas não só.
Nela, audiência preliminar, pode realizar-se:
a) Tentativa de conciliação;
b) Discussão sobre excepções dilatórias que o juiz deva apreciar;
c) Discussão sobre a possibilidade de conhecer imediatamente do mérito da causa;
d) Discussão destinada à delimitação do litígio e ao suprimento das insuficiências que (ainda) subsistam ou que só nesse momento sejam identificadas;
e) Prolação do despacho saneador;
f) Conhecimento imediato do mérito da causa;
g) Selecção da matéria de facto;
h) Outras finalidades secundárias, que somente são actuadas quando a acção haja de prosseguir para a audiência final (indicação dos meios de prova, requerimento de gravação da audiência final ou, em alternativa, de intervenção do tribunal colectivo: art. 508.º-A/2 CPC).
Observe-se que a audiência preliminar, caso seja realizada, não tem como objectivo a realização de todos estes actos. Ela normalmente realiza-se para nela serem praticados alguns dos actos acima referidos. E o juiz, no despacho onde marque esta audiência, deverá indicar o seu objecto e finalidade (art. 508.º-A/3 CPC).
O despacho saneador quando realizado na própria audiência preliminar (oralmente ou por escrito no prazo de 20 dias), pode apreciar tanto os aspectos jurídico – processuais da acção (excepções dilatórias e nulidades processuais) quanto, a título eventual, o conhecimento e o julgamento do mérito da causa (art. 510.º/1, b) CPC), se o estado do processo o permitir, pois, como facilmente se alcança, o julgamento do mérito da causa verifica-se normalmente na sentença final. Assim, o despacho saneador também goza, tal como o despacho pré – saneador de uma função de regularização do processo e de expurgação das excrescências processuais; de todo o modo, a maioria ou a totalidade dos obstáculos processuais (supríveis), que impedem o controlo da admissibilidade e do conhecimento do mérito da causa, já terão sido normalmente controlados no despacho pré – saneador. Se no despacho saneador não for detectado qualquer obstáculo processual ao conhecimento do mérito, o estado da causa pode possibilitar esse conhecimento imediato, que não é relegado para a sentença final. Neste caso, o processo termina com um despacho saneador – sentença (art. 510.º/1 b), CPC).









Despacho Saneador (exemplos);

O despacho saneador tanto pode ser proferido na audiência preliminar – sendo aí em regra, um despacho oral, ditado para a acta dessa mesma audiência (arts. 508.º-A/1 d), e 510.º /2 CPC) -, como, sendo esta dispensada, é proferido em momento processual autónomo daquele ciclo processual. Neste último caso, o despacho saneador deve ser proferido no prazo de 20 dias, a contar do termo da fase dos articulados (art. 510.º/1 CPC).
O juiz da causa deverá conhecer das excepções dilatórias que hajam eventualmente, sido suscitadas pelas partes e das nulidades processuais que hajam, eventualmente, sido suscitadas pelas partes. Se não tiver sido suscitada qualquer destas excepções ou nulidades, o juiz deverá simplesmente escrever (ou ditar para a acta, caso o despacho saneador seja proferido oralmente na audiência preliminar) que inexistem excepções dilatórias ou nulidades processuais. Esta afirmação genérica do juiz não faz caso julgado, já que o juiz não apreciou questões concretas respeitantes à verificação ou não verificação dessas excepções (art. 510.º/3 CPC). Já fará caso julgado, e nessa parte será imodificável, se e quando apreciar as questões concretas da falta de pressupostos processuais ou outras nulidades da instância. Se tiver sido suscitada pelas partes alguma excepção dilatória que o juiz entenda não se encontrar verificada, deverá decidir fundadamente, no saneador, essa questão. Se, pelo contrário, for invocada uma excepção dilatória insuprível ou uma excepção dilatória suprível, mas que não foi sanada após o convite que o juiz tenha efectuado no despacho pré – saneador, o juiz deve relatar e fundamentar esta verificação e absolver, nesse mesmo despacho, o réu da instância. Se a excepção era sanável, e foi sanada, o juiz deve, no despacho saneador, relatar o sucedido e declarar que a excepção dilatória se encontra já suprida, podendo o despacho saneador analisar as demais questões.
Compete ainda ao juiz, conhecer das nulidades processuais suscitadas pelas partes ou que o juiz, face aos elementos já constantes dos autos, deva apreciar ex officio. E deve conhecê-las, ainda quando elas não provoquem a anulação de todo o processo (falta de citação do réu art. 194-º/1 CPC); sendo que o Professor Remédio Marques distingue entre nulidades processuais principais (anula todo o processo), de nulidades processuais secundárias (prática de actos que a lei não admita, ou a omissão de formalidades que a lei prescreva, art. 201.º CPC).
Concluindo o juiz da causa que não há excepções dilatórias, nulidades processuais ou outras irregularidades da instância que impeçam o conhecimento do mérito da causa, o juiz pode, nesta fase processual, entender que já se encontram reunidas as condições para conhecer do pedido, de algum dos pedidos cumulados, do pedido reconvencional, ou da verificação de alguma excepção peremptória (art. 510.º/1 b) CPC), sem necessidade de mais provas senão as que já constam dos articulados (maxime documentos). Nesta eventualidade, e após uma prévia discussão com as partes sobre a matéria de facto e de direito (art. 508.º-A/1 b), CPC) – isto, acentue-se, para evitar decisões – surpresa e para prevenir alguma precipitação do juiz no conhecimento do mérito da causa -, ao despacho saneador é atribuído valor de sentença (art. 510.º/3 CPC), podendo dele interpor-se recurso de apelação (art. 691.º/1 CPC).
Se o juiz concluir que há excepções dilatórias não sanáveis ou nulidades processuais, que conduzam à anulação de todo o processo ou à absolvição da instância (ineptidão da petição inicial), ou que determinam a anulação de certos actos realizados após o cometimento dessa nulidade processual, então ele deverá absolver o réu da instância, mandar praticar o acto omitido ou anular o acto nulo e o processado subsequente (ou só os actos que não possam ser aproveitados: por exemplo, no erro da forma de processo, nos termos do artigo 199.º/1 e 2 do CPC, determinando o prosseguimento na forma processual adequada).
Pode ainda suceder, que no momento do despacho saneador, não se possa apreciar uma excepção dilatória, porque os elementos fornecidos pelo processo ainda não permitem o seu julgamento, desta forma, será apreciada na sentença final (art. 510.º/4 e art. 660.º/1 do CPC), como podemos observar através deste exemplo: o réu invoca litisconsórcio necessário convencional (art. 28.º CPC); para se pronunciar sobre esta excepção, o tribunal tem de conhecer se a solidariedade afirmada pelo autor foi realmente convencionada pelas partes (art. 513.ºCPC), pelo que, se no momento do despacho saneador essa prova ainda não tiver sido produzida, o tribunal está impedido de apreciar aquela excepção.
Do despacho que diferir o conhecimento de qualquer matéria para a sentença final não cabe recurso (art. 510.º/4). Para o Professor Miguel Teixeira de Sousa, esta irrecorribilidade justifica-se porque, nessa eventualidade não está na decisão, mas antes uma abstenção de decisão.
Exemplo da forma assumida por um despacho saneador na acta de uma audiência preliminar:
Acta de Audiência Preliminar
Processo n.º 110/04TBRC
1.ª Vara Mista – Acção Declarativa ordinária sob a forma de processo ordinário.
Data: __, de __, de ___, pelas 9 horas
Autor: __
Ré: __
Juiz de Direito: __
Escrivã de Direito: __
Advogado do Autor: __
Advogado da Ré: __
Presentes: os ilustres mandatários das partes.
De seguida, o M.mo Juiz proferiu o seguinte DESPACHO SANEADOR, nos termos previstos nos artigos 508.º A/1, alínea d), e 510.º/1, alínea a), do CPC:
“O tribunal é competente internacionalmente, em razão da matéria e da hierarquia. Não existem nulidades que invalidem todo o processo. As partes têm capacidade e personalidade judiciárias, encontram-se devidamente representadas em juízo e são legítimas.
Existe uma excepção dilatória – a da incompetência deste tribunal em razão do território -, que cumpre conhecer sumariamente.
Na verdade, o autor alega ter celebrado um contrato de depósito oneroso com a Ré, pelo qual esta se obrigou a pagar a quantia de 30 000 Euros. O pedido do autor traduz-se assim numa obrigação pecuniária, e não no pedido de restituição das coisas depositadas (pedido que somente poderia ter sido feito pela Ré enquanto depositante). Vale isto por dizer que, na perspectiva do modo como o autor configurou o objecto da acção (pedido e causa de pedir), o lugar da prestação é dado por uma disposição especial, exactamente a do artigo 774.º do Código Civil (lugar do domicílio do credor ao tempo do cumprimento) – cf. ANTUNES VARELA, Das Obrigações em geral, Vol. II, 7.ª edição, Almedina, Coimbra, 1997, pp. 36-37 -, e não o lugar do domicílio do devedor (que traduz a regra geral: artigo 772.º/1 do Código Civil). Ademais, o artigo 74.º/1 do CPC, na redacção da Lei n.º 14/2006, de 26 de Abril, permite que, sendo o réu uma pessoa colectiva, o autor possa optar por demandá-lo no domicílio deste réu ou no tribunal do lugar em que a obrigação deveria ser cumprida. No caso sub iudice, a Ré é uma pessoa colectiva e o autor demandou-a precisamente no lugar em que, nos termos do critério especial fixado no artigo 774.º do Código Civil, a obrigação deveria ser cumprida, ou seja, em Coimbra, no lugar do domicílio dele credor (autor). Pelo exposto julgo este Tribunal competente em razão do território para tramitar e julgar a presente acção. Não existam mais excepções ou questões prévias de que cumpra conhecer”.
Após debate, o M.mo Juiz, nos termos do artigo 508.ºA/1, alínea e), do CPC, passou a seleccionar a matéria de facto relevante para a decisão da causa e que já se mostra assente por acordo das partes, o que fez da seguinte forma:
A)
O autor é um comerciante em nome individual, dedica-se à actividade de armazenista de mercadorias – doc. De fls.___;
B)
O autor é titular de vários armazéns, situados em _____________ - acordo das partes;
C)
A Ré é uma sociedade comercial por quotas, com sede na _______ - doc. a fls. E acordo das partes;
D)
Autor e Ré celebram um contrato no dia ______ - doc. a fls. ______ e acordo das partes;
Fixada a matéria de facto considerada assente, o M. mo Juiz, em conformidade com o disposto nos artigos 508.ºA/1, alínea e), e 511.º/1, ambos do CPC, passou a seleccionar a matéria de facto considerada relevante para a decisão de causa e que ainda se mostra controvertida, a qual passará a integrar a Base Instrutória, o que fez da seguinte forma:
1.º
O autor comprometeu-se, através do contrato mencionado supra em D), a guardar as mercadorias que lhe foram entregues pela Ré?
2.º
E ficou com a obrigação de as restituir após o decurso do prazo de 120 dias?
3.º
A Ré comprometeu-se a pagar ao autor a quantia de 30 000 Euros, como contrapartida das obrigações assumidas pelo autor e referidas supra no ponto n.º1?
4.º
O autor disponibilizou á Ré as instalações do referido armazém para esta as usar e nelas armazenar a mercadoria, durante 120 dias?
5.º
Findo os quais deveria restituir essas instalações ao autor, entregando a este as respectivas chaves?

Seguidamente, o M.mo Juiz, nos termos do artigo 511-º/2 do CPC, concedeu a palavra aos ilustres mandatários das partes para, querendo, reclamarem contra a selecção da matéria de facto incluída na base instrutória ou considerada como assente, com fundamento em deficiência, excesso ou obscuridade, tendo os mesmos afirmado nada terem a reclamar.

De seguida, o M. mo Juiz, ao abrigo do disposto no artigo 512-º/2, alínea a), do CPC, concedeu a palavra aos ilustres mandatários das partes para, querendo, apresentarem os respectivos meios de prova, o que fizeram da seguinte forma:
Pelo ilustre mandatário do autor foi dito que o mesmo pretende apresentar o seguinte rol de testemunhas:
-A, casado, empregado bancário, residente na Rua _________, em Coimbra, cuja notificação para comparência em Tribunal na data que vier a ser designada para a realização da audiência de julgamento desde já requer.
Pelo ilustre mandatário da Ré foi dito que a mesma pretende apresentar o seguinte rol de testemunhas:
-B, solteiro, comerciante, residente na Rua ___________, em Vieira do Minho, cujo depoimento requer que seja prestado por teleconferência (artigo 623.º/1 do CPC), a partir do tribunal da comarca da sua área de residência, ou seja, o Tribunal Judicial de Vieira do Minho.
Seguidamente, pelo ilustre mandatário da Ré foi pedida a palavra e uma vez no uso dela requereu a gravação da audiência final, ao abrigo do artigo 508.ºA/2, alínea c), do CPC.


De seguida, pelo M.mo Juiz foi preferido o seguinte:
DESPACHO
“Admito os róis de testemunhas apresentados pelas partes, por a sua extensão se conter dentro dos limites referidos no artigo 632.º/1 do CPC, e por as mesmas se mostrarem devidamente identificadas, em conformidade com o disposto no artigo 619.º/1 do CPC. Nos termos do artigo 508.ºA/2, alínea c), e 522.ºB, ambos do CPC, a audiência de discussão e julgamento será objecto de gravação”.
Uma vez que o processo se encontra em condições de prosseguir, nos termos do artigo 508.ºA/2, alínea b), do CPC, após acordo com os ilustres mandatários (artigo 155.º/1 do CPC) e ouvido o tribunal onde a testemunha indicada pela Ré prestará depoimento (artigo 623.º/2 do CPC), a realização da audiência de discussão e julgamento terá lugar no próximo dia _______, de ____________, de __________, pelas 14 horas, neste Tribunal [Note-se que, nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 184/2000, de 10 de Agosto, a marcação das audiências de discussão e julgamento não pode ser feita com a antecedência superior a três meses].

Seguidamente o M.mo Juiz deu por encerrada a Audiência Preliminar.

De tudo quanto antecede foram os presentes devidamente notificados, do que disseram ficar cientes.

Para constar se lavrou a presente acta que, depois de lida e achada conforme, vai ser assinada.

Matéria Instrutória;

Se o despacho saneador, efectuado na própria audiência preliminar ou fora dela, não puser termo à acção contestada e esta houver de prosseguir, o juiz deverá seleccionar, de entre os factos articulados pelas partes, aqueles que interessam à decisão da causa e devem ser considerados já como provados e aqueles que, por serem controvertidos, por não se acharem provados pelos documentos juntos, ou por não terem sido admitidos por acordo ou não terem sido confessados, necessitam de ser provados. É claro que, na mente do legislador, a selecção da matéria de facto, que há-de fixar os limites da actividade instrutória e o objecto do poder jurisdicional do tribunal, resulta de um debate entre os advogados das partes e o juiz, nos casos em que existe audiência preliminar e a acção haja de prosseguir para as fases seguintes: aqui, e não é demais repeti-lo, o despacho saneador com a selecção dessa matéria de facto é proferido oralmente, salvo se for complexa a selecção das questões factuais (art. 510.º-A/2 CPC).
Relativamente à selecção dos factos (essenciais/instrumentais), apresenta-se como fulcral, a distinção entre questões de facto e questões de direito. Uma metodologia prática – judicativa adequada leva a distinguir estas questões da seguinte forma: a matéria de facto diz respeito a:
a) Averiguação dos factos, às ocorrências concretas da vida real, ao estado, à situação real das pessoas e coisas;
b) Aos acontecimentos do foro interno da vida das pessoas;
c) Ocorrências hipotéticas (saber se o condutor do veículo teria ou não podido travar num espaço livre e visível à sua frente se os travões tivessem sido correctamente verificados e inspeccionados);
d) Aos juízos periciais de facto (saber qual a percentagem da diminuição da capacidade de trabalho);
Já pelo contrário, a matéria de direito respeita à aplicação das normas jurídicas aos factos, à valoração feita pelo tribunal, de acordo com a interpretação ou a aplicação da lei e a qualquer juízo, indução ou conclusão jurídica; e o resultado dessa actividade é avaliado segundo um critério de correcção ou de justificação. Isto significa que não podem constar da selecção da matéria de facto integrante da base instrutória da causa as questões de direito, a matéria de direito, sob pena de se considerarem não escritas (art. 646.º/4 CPC).
Na fixação da base instrutória e na decorrência do princípio do dispositivo ou disponibilidade das partes, o tribunal deve atender aos factos articulados pelas partes, independentemente de terem sido alegados pelo autor ou pelo réu. Observe-se que estes factos articulados pelas partes têm que ser, no mínimo, os factos essenciais que por elas tenham sido alegados. Não podem ser seleccionados factos essenciais para a justa composição do litígio que elas não alegaram. Todavia, o juiz pode seleccionar factos instrumentais, mesmo que não tenham sido articulados pelas partes. Mister é que o juiz tenha motivos para considerar tais factos instrumentais necessários para o apuramento da verdade. Há no entanto, factos instrumentais que devem constar da base instrutória, e nesses casos, segundo os Professores, Lebre de Freitas, João Redinha e Rui Pinto, os factos instrumentais como que seguem o regime dos factos principais. Normalmente, é na fase da instrução, maxime, na actividade instrutória que ocorre na própria audiência de discussão e julgamento, aquela em que o tribunal averigua oficiosamente os factos instrumentais (art. 650.º/1 f) e art.264.º/2, CPC). Mas, nada impede que o juiz da causa não use logo esse poder por ocasião da selecção da matéria de facto no despacho saneador.
A peça, escrita pelo juiz, que contém a base instrutória é por ele redigida sob a forma de proposições interrogativas – denominadas quesitos -, subordinadas a números, onde são por isso mesmo formuladas perguntas a que o tribunal deverá responder, de harmonia com a convicção que venha a formar a partir da prova produzida (art. 655.º/1 CPC). Os quesitos devem ser claros e concisos, não contraditórios entre si ou com os factos dados como assentes. Na sua formulação não deve respeitar-se a ordem por que foram articulados por cada uma das partes, pois isso potencia o risco de respostas contraditórias; e nem devem ser formalmente separados os factos articulados pelo autor e os factos articulados pelo réu; deve, ao invés, tal formulação ser una e indivisa, independentemente da pessoa que os articulou e da forma como os articulou, privilegiando o juiz a sequência lógica dos factos, escolhendo sempre uma redacção susceptível de respeitar a repartição do respectivo ónus da prova.
Qualquer das partes pode apresentar reclamação contra esta selecção dos factos – factos controvertidos e factos assentes – feita pelo juiz da causa (arts. 508.º-A /1 c), e 511.º/2 CPC). Se esta selecção, que incorpora o despacho saneador, for logo feita na própria audiência preliminar, as reclamações devem ser imediatamente ditadas pela parte reclamante para a acta da audiência. Apresentada essa reclamação, o juiz deve logo decidi-la, ouvindo-se previamente a parte contrária. A selecção da matéria de facto não cristaliza nem torna indiscutível que não existam outros factores relevantes controvertidos ou que alguns dos factos controvertidos nela incluídos sejam, afinal, factos considerados assentes. Se esta selecção for feita no despacho saneador elaborado e proferido fora da audiência preliminar, as partes também ficam salvas de reclamar contra essa selecção. E podem reclamar, após terem sido notificados do despacho saneador, no prazo geral de 10 dias (art. 153.º/1 CPC), dando-se à contraparte, idêntico prazo para responder às reclamações. Uma vez que uma parte conteste a reclamação apresentada pela outra, o juiz deve logo decidir.
Ao abrigo do disposto no artigo 511.º/2 CPC, as reclamações contra a selecção da matéria de facto podem basear-se na:
a) Omissão, de factos alegados com interesse para a decisão da causa;
b) Inclusão, de factos indevidamente considerados como controvertidos (excesso de factos);
c) Obscuridade, na selecção de factos, na medida em que estes se encontrem redigidos em termos que concitam dúvidas sobre o sentido e alcance das proposições linguístico – gramaticais pelas quais são apresentados, pelo juiz, nessa base instrutória.

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